Depois de se olhar no espelho, se bendizia, pedindo ao pai para levá-la à igreja. Lá assistia à missa no corredor central, próximo ao altar, vendo de perto a gente de libras passando a missa pelas mãos. Pensava que melhor seria ter os ouvidos cortados, ao invés das pernas. Mas essa era a sina. O pai nunca ficava, deixava a cadeira travada no domingo de sempre e partia para sua devoção; cerveja, dominó e dívidas. Ela, após a hóstia recebida, contava o fim da cerimônia. Ouvia o som do metal em borracha, destravando as rodas, e da mão do empurrão.
Era assim, toda manhã de domingo com a igreja vazia, a cadeira seguia pelo corredor lateral a fora. Ele se virava e se benzia. Ela não. O vento na porta do santuário despertava seus mamilos. E o gosto da hóstia desmanchava, conforme a porta do salão paroquial se abria e se fechava pelas mãos que a conduziam. Escutava o som pesado da tramela. E o ritual se dava como em todo primeiro dia da semana. Frio e escuro. A mão que a suspendia a erguia à altura dos lábios consagrados num expulsar de purificação. O gosto do homem se instalava em sua boca e com rapidez no centro de suas meias pernas. E nessa fusão, já não sentia a ausência dos membros inferiores. Era um instante, um rápido instante lhe devolvendo o gozo de pisar no chão. Enquanto, ele gemia estar nos céus.
4 comentários:
Nossa,forte e impactante, cheio de imagens e irreverência. Amei.
Um soco de soco ingles na boca do estômago.
Sinto o gosto da poesia em sua prosa, por isso eu amo.
porra... "proesia" quintanesca com o raio que o parta a quatro e tanta lascívia e sensualidade que é quase como ouvir um bafo quente e rouco ao pé do ouvido... de fu"Dê"! ótimo!
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